sexta-feira, 20 de junho de 2008

Um temor que vem do teclado



O mesmo discurso que acalenta é capaz de sangrar. Aquele rapaz, mais do que ninguém, sabia disso. Conhecia bem o peso da palavra escrita. Era o seu ganha pão. Tinha plena consciência de que uma vírgula fora do lugar, uma ordem inversa de orações, um verbo mal empregado ou um adjetivo fora de contexto poderia suscitar equivocadas interpretações, desastrosas reações. Também temia o silêncio das entrelinhas. Segundo ele, um buraco negro sem timbre, entonação, gestos, expressões faciais, respiração, piscar de olhos. Um ambiente profícuo para deduções levianas. Lembrou da universidade, dos teóricos e seus conceitos. De como o ruído na comunicação é capaz de provocar danos.


Diferentemente do projétil (que estraçalha o osso) e da lâmina (que desfigura a carne), o teclado provoca estragos silenciosos. Não há grito ou sangue, mas muito choro e dor. Mais uma vez estava diante de uma situação fora de controle. Entretanto, o fardo da culpa já não comprimia com tanta força sua lordose. Porque ele simplesmente não destilava maldade na ponta dos dedos. De qualquer forma, aquela foi uma tarde de reflexão. Talvez fosse a hora de girar o botão da autocensura ao nível máximo. Desligou o monitor com a certeza que daquele ponto em diante seria um homem de meias palavras. Passou o resto do dia em silêncio. Porque tudo que ele sabia fazer nessa vida era escrever.

5 comentários:

Anônimo disse...

eu não gosto quando vc está em silêncio. isso me fere mais do que um texto bem/mal escrito. gosto de vc falante, sorridente e abraço.

falei e disse. porque comigo não tem isso de silêncio. eu falo mesmo. pelos cotovelos. *rs*

;*

Anônimo disse...

Oi, Panela! Adoro ler seus textos! Bjos

Anônimo disse...

Beijos meu querido e introspectivu amigo (rs)!

Livia Cavalcanti disse...

Daqui a pouco o blog vai fazer jus ao nome mesmo: o que mais ninguém vê...onde estão os textos????????????

Saga disse...

adoro verbos mal empregados, rs