quarta-feira, 27 de abril de 2011

Velha guarda

Gosto quando a sedução trabalha sem pressa, respeitando o seu próprio tempo e ritmo. Sem a obrigação de mostrar resultados “pra ontem”. Como se o sentimento fosse um fast-food, embalado e prontinho para ser devorado em menos de 15 minutos. Eu sei, sou antigo, ultrapassado, lento, quase um fóssil. Mas ainda não entrei na lista de extinção. Tenho convicção disso quando eu vejo alguns amigos ensaiando um novo romance, começando uma nova história. Eles estão lá, assim como eu, dançando Sinatra, enquanto o bar inteiro pede punk rock.

domingo, 24 de abril de 2011

Formato Mínimo



Nunca soube demonstrar interesse. Não era por maldade, frigidez ou charminho. Era o jeito dela. E ponto. Os amigos cobravam mais efusividade, os amantes exigiam frases de entrega e devoção e a família pedia doses extras de afagos públicos e explícitos. Mas apesar de tantos apelos ela continuava a amar discretamente, querer sem histeria, cobiçar sem ganância, paquerar sem alarde, se entregar sem exageros. Na realidade, ninguém sabia o quanto aquela mulher queimava por dentro (a não ser o seu gastroenterologista que descobriu semana passada a causa do maldito refluxo incendiário). Sexta-feira, num impulso sentimental, eu expulsei o que estava guardado no peito há meses: eu gosto muito de você! A resposta chegou como um tiro: ok! E antes que eu reclamasse da economia das palavras ela completou sorrindo: Não se assuste, moço. O amor nem sempre é enxurrada.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Procurando um título...


Foto Deviantart


Quando você (finalmente) descobrir o significado do verbo surpreender, por favor, me procure. O cachorro está preso e o portão sem cadeado.


Clicou no botão enviar e fez a única coisa que estava ao seu alcance: cruzou os dedos (numa tentativa fajuta de atrair a sorte). A resposta não veio, o ferrolho não fez barulho e nenhum latido anunciou a chegada de uma nova visita. Depois de muita espera fez o que todo mundo faz com as ausências. Resignou-se. O que ele não sabe é que o querer, além de não dormir, tem um apetite voraz e um passatempo curioso (quase sádico). Costura em silêncio corações baqueados, só para vê-los perder a estribeira novamente.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

A maldição da beleza

Dia desses estava pensando no fardo que as mulheres lindas, inteligentes, solteiras e bem sucedidas são obrigadas a carregar. Na quantidade de homens interessantes (o interessante em questão vai muito, muito além da estética) que elas deixam de conhecer justamente por possuírem tais atributos. Eu não sei se existe pesquisa científica, mas é comum você ler e ouvir que parte da classe masculina se sente intimidada e até assustada na hora de se aproximar, de começar uma conversa, de arriscar um diálogo. Ou seja, se elas não tomarem a iniciativa tudo acaba em zero a zero. Eu faço minha parte. Tento assustá-las primeiro. Sim, meus amigos, até a feiúra tem um propósito de ser.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Lado a lado

Foto Deviantart

Domingo não é o meu dia preferido. Ele não carrega a excitação das sextas, tampouco os desatinos dos sábados. Vive bocejando pelos cantos, com uma puta ressaca e preguiça de viver. É um dia sem tesão. Era. Até aquela mensagem chegar e tirar o prumo das minhas certezas.


Talvez eu não seja uma boa companhia, mas, ainda assim, eu preciso sair hoje...


Fiquei na dúvida se aquele texto era um desabafo, um convite, um desafio ou um passo para uma armadilha. Paguei pra ver. Decidimos por um bar longe dos holofotes. Sentamos perto do palco, pés na grama, coração leve, blues e bossa a nosso favor. Em quase três anos de convívio nunca estivemos tão perto um do outro (seja verbal ou fisicamente). Tentei dizer isso, mas Menescal e Bôscoli chegaram matando. Esperei ela terminar a última estrofe de “Ah, Se eu pudesse” e refiz a pergunta: o que você vai fazer no próximo domingo? Ela riu, pediu um gole da minha cerveja e respondeu: um passo de cada vez, meu querido, um passo de cada vez....

terça-feira, 5 de abril de 2011

Urgências

Ele a puxava para um lado, por tesão, e eu para o outro, por saudade. Ela, de braços abertos, olhava pra mim esperando que eu entendesse a urgência da sua partida. Sob a tenda, uma disputa silenciosa. Em jogo, mais atenção e carinho. O abraço rápido, sem calor e burocrático selou a minha derrota, que já era anunciada antes mesmo do cabo de guerra começar. Na realidade, o primeiro indício de que eu a perderia na multidão foi revelado entre o primeiro e o terceiro bater de pálpebras. Foi nessa fração de segundos que eu li o recado em seus olhos negros: “Desculpa, Celo. Agora não. Vou ali ser feliz e não volto”. Ironicamente o DuSouto começou a cantar “aonde está meu outro par da sandália havaiana”. Comprei mais uma cerveja quente e empurrei goela abaixo o maldito nó atravessado na garganta.